NO CAPÍTULO ANTERIOR...
Circo La
Mustafá – Noite.
[Felipe
está deitado em um banco, pensativo, Bruno chega correndo, apavorado]
Bruno:
Felipe! Felipe!
[Felipe
levanta assustado]
Felipe:
Que afobamento é esse? O que foi?
Bruno:
Vão nos vender Felipe! Nos vender!
Felipe:
Vender? Quem?
Bruno:
O Seu Leôncio, dono do circo, escutei ele dizendo que vai nos vender. Vender
Felipe!
[Felipe se
assusta com a noticia]
AGORA...
Circo La
Mustafá – Noite.
[Felipe se
assusta com a noticia]
Felipe:
Tá falando sério Bruno?
Bruno:
Seriíssimo cara... Eles querem nos vender.
Felipe:
Isso não pode ser verdade.
Bruno:
O pior é que é... E vai saber pra quem eles vão nos vender... Acho que nos
metemos em uma roubada.
Felipe:
Não podemos ir embora daqui Bruno.
Bruno:
Como não? Ficou doido?
Felipe:
Não podemos. Se o Seu Leôncio manda seguir a gente, mata o pai e a mãe.
[Bruno se
assusta]
Aterro Tenente
Baronel
Casa de Zumira
e Aristides – Noite.
[Zumira
está ajoelhada sob as cinzas no local, diversas pessoas circulam, curiosos
observam e jornalistas cobrem a matéria]
Zumira:
Aristides! [Ela chora muito] Meu
Deus! Por quê? Por quê?
Neide:
Zumira, se levanta mulher. Tá todo mundo te olhando.
[Ela se levanta
nervosa, eufórica]
Zumira:
Que olhem! Quer olhar? Olhem! Invejem a minha desgraça!
[Ela se
aproxima de uma jornalista que estava dando a matéria ao vivo e pega o
microfone, olhando para a câmera, gritando e chorando]
Zumira:
Isso é uma vergonha! Uma vergonha para esse país de bosta que é o Brasil.
Autoridades que não fazem nada! Nada! Estamos jogados na joça desse lixão à
Deus dará, com essas víboras do governo nos comendo vivos! Vivos! Meu marido
morreu por causa da desgraça desse país que não faz nada. Impostores!
[A repórter
tenta tomar o microfone, mas ela não deixa, mais pessoas vão se aproximando]
Zumira:
Eu ainda não terminei... Enquanto eu, mulher batalhadora, tive que me vender
pra um bando de jovens tarados e um velho viciado. [Ela se emociona] Tive que me prostituir pra tratar a minha
família, chego em casa e me deparo com esse vexame, um pai de família morto com
seus seis filhos. É uma vergonha Brasil! Quero esfregar essa bosta que os
políticos fizeram na cara de vocês.
[Neide puxa
a amiga e a repórter consegue estabilizar a matéria]
Neide:
Ficou doida Zumira? Se acalme... Se rebelar a essa hora do acampamento não vai
adiantar muita coisa.
Zumira:
Você não está sentindo o que eu estou sentindo. [Ela grita] Não está! Não foi você quem perdeu toda a família!
Neide:
Calma... A policia já foi atrás da Miriã.
Zumira:
Miriã? O que aquela vadia tem a ver com isso?
Neide:
Alguns moradores avistaram ela saindo da sua casa, minutos antes do incêndio.
Zumira:
Vadia! Vadia! Se eu pego aquela vaca gorda eu mato ela.
[Zumira sai
apressadamente, Neide vai atrás tentando acalma-la]
Pensão -
Quarto – Noite.
[Antônio,
capanga de Antunes, assiste a TV enquanto come uma marmita e vê o noticiário]
- Jornal –
Jornalista:
Uma mulher, cujo nome ainda não foi identificado, invadiu as câmeras de uma
famosa rede nacional de televisão e fez revelações comprometedoras sobre a
morte do marido. Segundo a autora do escândalo, ela se prostituiu para um
poderoso homem, afim de conseguir dinheiro para sustentar a familia.
[A foto de
Zumira é mostrada]
- Jornal –
Antônio:
Ih cara... Não é que a mulher botou mesmo a boca no trombone? [Ele grita o nome de Antão] Antão! Ô
Antão! Corre aqui cara!
[Antão sai
apressado do banheiro, com a toalha enrolada na cintura]
Antão:
Que diabo tu tá com essa gritaria cara? Pensei que fosse os tira barrando aê...
Antônio:
Tu tá no noticiário!
Antão: Que?
Antônio:
Aquela nega lá tava falando de você. Não foi ela quem você deu uns amassos?
[Antão a reconhece
e muda o semblante]
Antão:
Aumenta o volume.
[Ele
aumenta o volume.]
- Jornal –
Zumira: [...] Enquanto eu, mulher batalhadora, tive
que me vender pra um bando de jovens tarados e um velho viciado [...].
- Jornal –
[Antônio
coloca a TV no mudo e ri alto]
Antônio: Velho
viciado? Essa é nova hein?! Ô coroa tá pegando geral!
Antão:
Cala a boca cara...
[Ele fica
pensativo]
Antônio:
Eu já vi de tudo: macacão, titio tarado, Antão bengala, ursão peludo,
pau-de-fumo, agora velho viciado? [Ele
dá uma gargalhada alta] Essa foi de tirar o chapéu!
Antão:
Pega tua arma e a chave do carro, vou trocar de roupa.
Antônio:
Aonde vamos?
Antão:
Temos um serviço pra fazer com essa mãe da África! De hoje ela não me escapa!
Circo La
Mustafá – Noite.
[A chuva e
as tempestades são frequentes e fortes. Felipe divide uma rede com o irmão e
estão cobertos por um fino lençol, outras pessoas do circo dividem o mesmo
local que eles, dormindo na mesma rede. Felipe se levanta, senta no chão e
encosta a cabeça na parede de madeira, pensativo, olhando a lua cheia por uma
fresta. Uma lágrima rola sob sua face]
- Flashback –
Felipe:
Eu sei... Amanhã já não temos o que comer... A mãe fez os últimos dois ovos
ontem.
Bruno:
O homem que compra cobre não passou faz duas semanas.
Felipe:
Vamos ter que trabalhar, senão “maínha” vai acabar morrendo.
Bruno:
Seremos unidos Felipe, e sempre ajudaremos a mãe.
Felipe:
Sempre. E nada, nem ninguém vai nos separar.
- Flashback –
[Felipe se
assusta com o barulho de algo caindo. Tudo fica calmo novamente. Ele então
percebe que alguém está acordado, não sabe quem, com a sensação de quem alguém
o está vigiando. Ele então sussurra.]
Felipe:
Tem alguém aí?
[Nada se
movimenta. Alguém, que estava atrás dele coloca a mão fortemente sobre seu
ombro. Ele se assusta]
O trabalho Doce Urbano de Sadrack Oliveira Alves foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivados 3.0 Não Adaptada.
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